CAPÍTULO 14 - A LUZ EM TODAS AS COISAS

No capítulo XLI da Regra, São Bento, ao tratar da hora das refeições, estabelece que na Quaresma se jantará depois das Vésperas, mas de tal modo que a refeição termine à luz do dia. Após ter disposto todas as coisas para que assim se façam, acrescenta, para terminar todo o capítulo, esta reflexão: Que tudo se faça com luz: Cum luce fiant omnia.

Dizíamos num capítulo precedente: É preciso saber! E nós cremos poder aproximar esta palavra da máxima de São Bento: cum luce fiant omnia. Que tudo se faça com luz.

O espírito dos santos, formado na escola do Espírito de Deus, é como Este, ao mesmo tempo uno e múltiplo. Lemos no livro da Sabedoria que o Espírito Santo, Espírito de inteligência é uno e múltiplo: Spiritus intelligentiae Sanctus, unicus, multiplex. Igualmente o espírito dos santos é uno, porque se recolhe todo em Deus e na Sua santa vontade; ele é múltiplo, porque na sua unidade abarca a extensão imensa dos caminhos de Deus e todo o conjunto tão harmonioso dos meios de chegar a Ele.

Quando São Bento, falando das refeições, diz que tudo se faça com a luz do dia, ele vai muito além. À luz do dia se sobrepõe a luz espiritual que Deus infunde nas almas.

Estas também têm a sua luz e a sua refeição. Alimentam-se com a verdade eterna, desalteram-se na fonte da vida. A hora abençoada destas refeições celestes é a da oração, da salmodia, do Sacrifício eucarístico, da comunhão e mais tarde será a da visão de Deus no céu.

Ora, em todas estas coisas, há uma luz que São Bento deseja para seus filhos. É preciso saber! As trevas têm algo de entristecedor, de repugnante, de terrificante. Mesmo sob o ponto de vista material, São Bento não quer que haja trevas no mosteiro: uma lâmpada deve iluminar o dormitório até o nascer do dia. Com mais forte razão, é preciso luz para as almas. A meia luz não basta; a fé procura compreender sempre melhor: Fides quaerit intellectum, é a palavra de Santo Anselmo. É preciso luz plena e total. Nosso Senhor o disse numa parábola: Tende na mão uma tocha acesa. E São Paulo dizia e escrevia a seus fiéis: Sois filhos da luz, do dia claro: não filhos da noite nem das trevas.

Quando, rodeado de seus irmãos, São Bento cantava o Ambrosiano, o hino de Santo Ambrósio: Splendor paternae gloriae, como deveria saborear Aquele que é a luz, que nesse hino encontra-se denominado Plena aurora; Aurora totus! Para nós plena aurora, para os anjos todo luz no seu zênite.

Arrebatado de alegria nos esplendores desta aurora, ele saboreava a doçura das iluminações divinas, e esperando o grande dia da eternidade, ele penetrava já nas profundezas das claridades superiores. “Enquanto os irmãos dormiam, São Bento, de pé junto à janela, estava em oração antes da hora das Matinas. Levantou então os olhos e, de repente, viu descer do alto uma luz tão grande que todas as trevas foram dissipadas por um esplendor bem superior à luz do dia. E neste esplendor, que não era da terra, o santo viu o mundo inteiro ser trazido diante dele e condensado como debaixo de um só raio de sol”.

Quando, depois de tais graças, retornava para junto de seus irmãos, a fim de regular até as coisas mais comuns da vida, São Bento dizia com um acento muito profundo: Que tudo se faça com luz: Cum luce fiant omnia.

É preciso notar que estas harmonias maravilhosas que enchiam a alma do santo, estendiam-se até à forma com a qual se revestia o seu pensamento. Como trabalhada, poetizada por uma inspiração celeste, a expressão tomava a forma dum verso jâmbico duma beleza perfeita:

Cum luce fiant omnia.

Verdadeiramente, seria bom, seria agradável ler assim, ler frequentemente com o espírito dos santos.

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